domingo, outubro 25, 2009

"...SIM, E AGORA EU QUERO VOLTAR LÁ PRO CÉU..."
Nando Reis, Sim.







"...eu quero estar de volta
eu quero ter você quado estiver de volta
eu quero você pra mim
não dou pra ficar só..."





Seu sono cheio de sobressaltos fez com que ele também não tivesse uma boa noite. Era sorte ter alguém que lhe velasse o sono, ainda que a custa do próprio. Ela estava estranha nos últimos dias e seu par não a queria só. Não se importava em sacrificar o descanso para protegê-la, não imaginava seu mundo sem ela. Apesar da rotina extenuante, ainda lhe sobrava ânimo para as gentilezas e carinhos dos amantes.
Ela não queria levantar e pediu que ficasse com ela. Ele não podia atender, mas prometeu ficar um pouco mais, arrumar-se um pouco mais rápido, quando fosse sair, para lhe fazer algumas vontades. Ela estava irritadiça, e ele pouco a reconhecia. Começou a se incomodar com tantos caprichos, o trabalho o aguardava. Seriam vinte e quatro horas tensas, será que ela não entendia?
Ele não quis briga, via com clareza o quanto iria atrasar, mas lhe deu algo para que relaxasse e ficou a seu lado, até fazê-la adormecer. Ela sentiu o calor do peitodo moço sob sua cabeça, se encheu de segurança e nem percebeu seus movimentos ao deixar a cama. Ele não tinha tempo para ponderar os medos da sua menina, precisava do salário no fim do mês e, no fim, tinha a presumida invulnerabilidade que todo homem carrega em si.
Arrumou-se sem barulho, deixou um "EU TE AMO" apressado escrito num pedaço de papel, preso embaixo do celular dela, e fechou a porta de casa sem alarde. Guiou entre os carros com a sensação de que devia voltar e sentiu-se tolo por se deixar contagiar pelas apreensões de alguém que não entende a lógica de seu dia a dia.
Ao chegar, a atmosfera de força do lugar lhe deu ânimo. Todos haviam saído, poucos homens ocupavam seus postos de trabalho. Não demorou muito sua presença foi exigida e um aperto no peito lhe falava do que ainda não havia feito. Teve vontade de ligar pra casa, de dizer que a amava, mas não havia tempo. Embarcou na aeronave checando seu equipamento, queria ter mais que certeza de que a missão correria bem. Os companheiros falavam de trivialidades, riam, enquanto sobrevoavam o Rio. Quantas não foram as vezes que embarcaram naquele mesmo voo? Ele pegou o rádio e esperou completar a ligação.
Ela acordou tarde e ligou a TV. A preguiça indo embora aos poucos, os sentidos se apresentando, um a um. Entrou no banho sem vontade e, ao sair, algo captou sua atenção. Na tela da televisão, um helicóptero em chamas. Na mesinha, na cabeceira da cama, um celular tocando, frenéticamente. Embaixo do telefone, um "EU TE AMO" rabiscado e a assinatura inconfundível marcando o papel. Ela atende o celular, não tira olho da TV. A voz do outro lado lhe conta de um horror pro qual nem seu medo irracional a podia ter preparado. Ela senta na cama, sem poder responder. Vê a TV, mas não ouve seus sons, não consegue ler as legendas na tela, não consegue lembrar de quem ela é.
Sentada na cama, abraçada ao travesseiro dele, ela reza pra que as últimas horas sejam só um pesadelo onde homens de bem saem pro trabalho e morrem abatidos em pleno ar, como pássaros na temporada de caça.




playlist


Nickelback - Save Me
ColdPlay - Lost
ColdPlay - 42
Keane - Everybody's Changing
Matchbox 20 - These Hard Times
Matchbox 20 - How Far We've Come




*(dis)sabores cotidianos*

domingo, outubro 04, 2009

"...THE QUIET SCARES ME CAUSE IT SCREAMS THE TRUTH..."
Pink, Sober.








"...I'm safe up high
nothing can touch me
but why do I feel this party is over?
no pain inside
you're my protection
so how do I feel this good sober?..."





O primeiro pensamento consciente veio em forma de interjeição: "CARALHO!". Abrir os olhos de uma vez se mostrou uma imbecilidade - o mundo gira e o maldito sol me queima a retina. Viro de bruços tentando acalmar o enjoo e fugir da luminosidade - "ARGH! AREIA!!!".
O celular no bolso e a bolsa ao alcance da mão provam, mais uma vez, a razão de quem defende a teoria de que 'Deus protege os bêbados' - "O que, DIABOS!, estou fazendo aqui???" - Nenhum flash da noite, nada em que me apoiar, nenhum rosto conhecido numa praia quase deserta, salvo por aquelas figuras peculiares ainda brincando com malabares.
Tento sentar na areia - "O que foi que eu bebi???" - e a cabeça lateja. Procuro a carteira na bolsa, e ela está intocada, assim como a cigarreira, a necessaire e as chaves da motocicleta. No celular, dezoito chamadas não atendidas - mamãe só ligou uma vez, há quarenta minutos. São quase sete da manhã e constato que dezessete chamadas foram originadas de um único número - "IDIOTA!".
O enjoo fica mais forte e ainda não lembro por que, mas já sei bem por quem vim parar aqui. Preciso de um café forte e um banho, não importa a ordem, mas antes preciso chegar em casa. Como? Preciso de um táxi - politicamente correta é o cacete, só não tenho condições de pilotar... Levantar exige um esforço sobrehumano, caminhar pela areia, tonta, é uma tortura. Pareço mil vezes mais pesada, lenta, desarrumada... Deprimente!
O hino do Flamengo toca em algum lugar, e eu demoro a fazer a conexão com meu telefone. Finalmente atendo, sem saber a quem. A voz do outro lado me dá uma ânsia de vômito maior do que a vodca barata que, com certeza e entre outras coisas, bebi. Passo alguns segundos ouvindo um blá blá blá interminável até alcançar a pista e entrar, em seguida, num táxi que providencialmente surgiu dos céus. Oriento o motorista e continuo a ouvir a ladainha monótona, repetitiva, desnecessária. Lembro que o cidadão que fala foi justamente a causa da sequência desastrosa que me leva para casa num domingo de manhã, pouco sóbria e muito puta! Sugiro que ele vá para o inferno e o choque deve tê-lo feito calar a boca. Aproveito para dizer tudo o que penso que ele deva fazer, além de calar a boca e ir pro inferno.
Durante alguns minutos o monólogo é meu: digo todas as coisas que os anos acumularam em nossa porta, todos os pequenos episódios que viraram o monstro do armário que assombra nossos sonhos, tudo aquilo a que não demos importância. Falo do nosso inferno pessoal e peço pra que ele não esteja no meu apartamento, no momento em que eu chegar. Ele tem quinze minutos e eu, bom, tenho uma vida inteira...





playlist

Ana Carolina
James Morrison
Nando Reis


LOUD: Pink - Sober.





"some relief"

domingo, agosto 23, 2009

"...OUR ROAD IS LONG, YOUR HOLD IS STRONG..."
Maroon 5, Secret.







"...say your goodbyes
off we go
some conversation
no contemplation
hit the road..."




Aguardava o fim do dia com um texto breve do Neruda e uma taça de syrah, nova aquisição da velha adega. Passara no Emporium, após sair da livraria em que encontrou o livro que tinha nas mãos, e não pôde resistir à empolgação do sommelier - duas belas aquisições, num mesmo dia, precisava admitir. Um início de noite morna prometia sabores interessantes e ela fitou o horizonte, distraindo-se da leitura.
Uma pontada de melancolia invadiu seu peito, uma lembrança doce que fazia contraste com o tanino da bebida. Uma tristeza súbita veio fazer companhia à boca seca, mas, ao contrário da saliva que abundava após pasar o efeito dos flavonóides, a esperança não dava sinais de voltar. Com um suspiro, concentrou-se novamente na leitura.
As palavras bem ordenadas conferiram sentido à contemplação a que se entregara. Aproveitou a vista da varanda, inspirou os aromas que a brisa trazia do mar. Degustou as palavras com a mesma vontade com que sorvia o vinho, distraiu-se com a cor forte da bebida, com o aspecto de fragilidade do cristal que a envolvia e logo havia esquecido das memórias queridas, mas distantes.
Em poucos minutos adormeceu, com o livro de poesias na mão. Sonhou um amanhã diferente, onde as lembranças fossem presente e o passado, um sonho bom.




playlist

House M.D. (1st season) Soundtrack
Brothers And Sisters (1st season) Soundtrack
Nothing Hill Soundtrack
Four Weddings And a Funeral Soundtrack







*falling asleep*

sábado, agosto 22, 2009

"...SO WHY DON'T WE GO SOMEWHERE ONLY WE KNOW?..."
Keane, Somewhere Only We Know.





"...I'm getting old and I need something to rely on
so tell me when you'll gonna let me in
I'm getting tired and I need somewhere to begin..."


Tenho fome. Uma fome incontrolável, que faz doer as entranhas. Fome de letra, e verso, fome de nota e som. Fome de melodia. Tenho fome de imagem, e texto. Fome de fotografia e quadro, de aquarela e massa. Tenho fome de batuque e de corda, de expressão, fome de emoção. Fome de dança, do clássico, de olhares e de admiração. Tenho fome do grito preso na garganta da torcida, da plástica da bandeira, do dia de sol que se põe no horizonte, no mar. Fome de estética, fome com e sem rótulo, fome de maquiagem, de interpretação. Fome de virtuosismo e fome de improviso, fome de surpresa, de vida, de beleza. Fome de contemplação. Nem sempre quem tem fome tem pressa.





playlist

Coldplay - 42
Coldplay - Clocks
Keane - Bedshapped
Keane - Somewhere Only We Know
U2 - One
U2 - Where The Streets Have No Name



*ser, só*

terça-feira, agosto 18, 2009

Efêmero...

"...IF THIS IS WHERE WE END IT UP THEN I REFUSE TO BE SO HARD ON MYSELF THIS TIME..."
James Morrison, The Only Night.








"...if everything I have is gone
then what is wrong
in spending time with you?
I'll keep you warm,
you'll hold me tight
this might be our only night..."





Dias comuns encerram-se em si mesmos. A noite joga seu pano preto e esconde o sol, as estrelas tomam posição e lá se vai. Não há o que se possa fazer. Dias comuns não suscitam expectativas, quando muito a esperança de que se acabem, rápido, pra dar chance ao dia seguinte, pra que aconteça algo de extraordinário que nos mova, que nos faça levantar.
Dias comuns nos dão preguiça, preguiça de gente, preguiça de vida, preguiça... O tédio toma conta e não se espera que a escolha do melhor lugar para uma viagem de uma hora no trem possa mudar isso. O cabelo preso no alto da cabeça deixa a coleção de tatuagens a vista de olhares cobiçosos. O fone do rádio o ouvido e uma atitude blasè completam a fotografia. O meio sorriso estampado no rosto, fruto do significado da música que tocava, já havia chamado uma atenção, em especial.
Ela continua pensando no dia sem sal enquanto contempla um rosto desconhecido, um torso nu de músculos definidos e uma enorme e bem executada tatuagem no braço, do outro lado do corredor. Apesar de não ser o tipo que a faria olhar duas vezes, ela olha. Ele olha, os olhares se cruzam e ela solta os cachos longos para esconder o rosto. Ele acha graça, encara. Ela foge, encabula. E começa o jogo! Dias comuns não trazem de presente, no fim, um sorriso sedutor e flertes certeiros. Ele continua a tentar aproximação, ela muda de posição, se reconhecem em olhares separados por ar e tensão.
Desconsertada, ela pega um chocolate na mochila, ele percebe e sorri. Poucos instantes, ele se dirige à porta, vai chegando a próxima estação. Cabeça baixa, lança um novo olhar para ela: pesar. Ela se angustia, e entristece. O trem para em frente à plataforma, ele diz um 'tchau', movendo os lábios, sem som. Ela fita o chão e a porta se abre. Ele exita, mas sai. Portas se fecham e ele parado na estação. O trem se move, ela o olha pela janela, acena, ele acena e diz que está ali todos os dias, àquela mesma hora. Ela sorri um sorriso muito particular e vira pra frente, enquanto o trem ganha velocidade. Um buraco se abre no peito e ela se sente só, como há muito não sentia. É bom e ruim, ao mesmo tempo. Se descobriu apaixonada, por poucos, mas preciosos, segundos... Não era um dia comum.




playlist

Jason Mraz - I'm Yours
Colbie Caillat - Bubbly
Jason Mraz & Colbie Caillat - Lucky
Sheryl Crow - All I Wanna Do
Jason Mraz - You And I Both



*momentos*

domingo, agosto 09, 2009

"...TIME IS SO SHORT AND I'M SURE THERE MUST BE SOMETHING MORE..."
ColdPlay, 42.





"...those who are dead are not dead
they're just living in my head
and since I fell for that spell
I am living there as well..."





Ela acordou um dia pensando no tempo. Estava frio, e estava perdido. Irremediavelmente. Não havia volta. Claro que sempre se podia remediar certas coisas, mas o que havia passado, passado. Resolveu encontrar uns amigos mais próximos, ainda que via Embratel. Sua lista de telefones ainda não estava tão desatualizada e sentiu-se feliz pelas tentativas que tiveram êxito, sentiu-se feliz pelo resto do mundo não fazer como ela e trocar o número do telefone como quem troca de vestido. De uma conversa despretensiosa surgiu a ideia do reencontro, que ficaria só na idéia se ela não estivesse em plena crise dos 30.
A vontade de saber como a mundo havia caminhado a moveu mais longe. Tinha formas de encontrar os queridos, poderiam fazê-lo. E lá se foi a lista de e-mails, a de telefone, as constantes atualizações quando identificava algo que não batia. Lá se foram horas nas redes de relacionamento, pincelando aqueles que eram parte sua, quer tivessem ou não clareza disso.
A cada novo contato aumentava a vontade. Foi descobrindo coisas novas sobre velhos conhecidos: os escritos de um, as vozes do outro, preferências musicais, implicâncias inexplicáveis, novas velhas habilidades, novidades previsíveis e outras surpreendentes. Descobriu que o menino franzino e tímido virara um homem decidido, que um espírito livre prendera-se pelo amor e que outros tantos libertaram-se do que ela, inclusive, pensava ser a vida. Eram tão novos que qualquer perda parecia distante, mesmo agora.
Ela foi dormir pensando no tempo. No quanto tinha de passado, nela mesma. Não estava mais frio, mas ainda havia a sensação de haver passado muito, mesmo com o sol brilhando lá fora. Descobriu que a melancolia não era pelo tempo, era por si.





playlist

Try Again - Keane
Bedshaped - Keane
42 - ColdPlay
Lovers In Japan - ColdPlay
The Scientist - ColdPlay
Sing - Travis
Human - The Killers



*again*

terça-feira, agosto 04, 2009

"...LIKE A GHOST INTO THE FOG..."
Counting Crows, Round Here.







"...she parks her car outside of my house
takes her clothes off
says she's close to understanding Jesus
she knows she's more than just a little misunderstood..."




Seus pés deixaram de tocar o chão. Não era sonho, mas o mundo se desfazia diante de seus olhos. A realidade se derretia, se derramava, como numa viagem de ácido barato. O tempo escorria por entre seus dedos e sentimentos intensos rolavam soltos pela sarjeta. Ela pretendia se agarrar a qualquer possibilidade de não enlouquecer, a fragmentos de sanidade, a lembranças boas...
Sua cabeça girava e pensamentos desconexos assombravam noites intermináveis. Foram semanas, dias ou horas, nunca vai saber precisar. Foram instantes de angústia, à deriva, sem norte. Foram momentos de um desespero ímpar, a sensação de quem se afoga num mar que não existe. O peito pesado de desesperança até que o céu clareou num sorriso que se abriu. Um sorriso que ela pôde usar como âncora...




playlist

Perfect Blue Buildings - Counting Crows
Round Here - Counting Crows
Color Blind - Counting Crows
Nothing Ever Hurts Like You - James Morrison
Undiscovered - James Morrison
The Pieces Don't Fit Anymore - James Morrison
Push - Matchbox 20
If You're Gone - Matcbox 20
Unwell - Matchbox 20



*a will*

sexta-feira, julho 31, 2009

"...QUE A CHUVA TRAGA ALÍVIO IMEDIATO..."
Engenheiros do Hawaii, Alívio Imediato.








"...a noite cai
de alturas impossíveis
e quebra o silêncio
e parte o coração..."




Os dias vão(s), dependem do tempo. Vão(s), lentos, ao sabor da solidão que oprime o peito, é inverno permanente. Ela para, tentando tomar ar. Interrompe a marcha frenética, sempre em frente, para tentar oxigenar o corpo, pra tentar organizar pensamentos. O pouco que consegue respirar lhe diz da sua angústia, não da baixa capacidade pulmonar. Passaria num teste de esforço, não numa prova de stress.
Ela entra no banho para lavar a alma. Se detém por horas numa banheira quente. Pensa demais. Projeta imagens na espuma branquinha, se distrái. Imagina companhia, absorve o aroma do incenso, imagina o branco tingido de vermelho, a consciência se esvaindo no calor do ambiente que a envolve. Pensa nele, e pensa que precisa voltar! É imperativo que tenha o controle, que as rédeas sejam retomadas. Faltam forças...
Desperta dos devaneios e veste um roupão. Ainda relaxada veste uma roupa escura e calça botas pretas, altas. Joga o telefone, as chaves e a carteira na bolsa. Prende os cabelos de forma displicente, inspeciona as unhas, diligente, a maquiagem é leve, quase nada. Sorri pra imagem no espelho, abre a porta e sai. Joga a aliança vistosa na lixeira do prédio - uma tonelada longe de seus dedos - e liga o carro. Ganha a rua. Só, mas livre.





playlist


Guns
EngHaw
Keane
ColdPlay
Nando Reis





*so*

sexta-feira, julho 24, 2009

"...YOU DON'T KNOW HOW LOVELY YOU ARE..."
ColdPlay, The Scientist.







"...I had to find you
tell you I need you
and tell you I set you apart
tell me your secrets
and ask me your questions
oh! let's go back to the start..."




Ela jurava não poder mais encontrá-lo, não como o idealizado - puro, justo, e arrebatador. Ela tinha desistido sem muitos questionamentos, não era de remoer frustrações. Sequer era de se frustrar com o que não podia resolver. Resignara-se. Pensava que era mesmo assim o amor romântico, que era platônico, não correspondido, complicado e dolorido. Deixou pra lá, a ponto de esquecer. Na correria de todo dia, não precisava de mais uma preocupação, não precisava ser refém de seus próprios sentimentos, ou dos caprichos de alguém.
Divertia-se como se o amanhã não existisse. Ela aprendeu a preencher aquilo que deveria ser vazio do seu jeito: até o sol nascer. O dia seguinte era descanso e avaliação, a lógica era não ser dependente. Um dia se destraiu, olhou pro lado. Amigos há anos incontáveis, sucumbiu. Descobriu-se não só vulnerável, suscetível, mas apaixonada. E não há mais nada de platônico, triste ou doloroso. Ele é o ideal, seu ideal, e só.




playlist

Keane
Coldplay
Móveis Coloniais de Acaju
CPM22
Skank
The Hives




*sonha(r)*

quarta-feira, julho 22, 2009

O que eu também não entendo...

"...LOVING YOU WAS EASY, PLAYING BY THE RULES
BUT YOU SAID LOVE TASTES SO MUCH BETTER WHEN IT'S CRUEL..."
James Morrison, Nothing Ever Hurt Like You.








"...to you everything was just a game
and oh yeah, you played me good
but I want you, I want you, I want you
so much more than I should, yes I do..."


Por instantes imaginou que ela não lembraria, só assim para ele pensar em se aproximar em público. Uma cidade estranha, a noite já ia alta, os ânimos diferentes, distrações não planejadas e ele não conseguiu se conter. Café e cigarros, frio e proximidade, clima aconchegante. Sensível, ele se expôs como nunca, como ele nunca havia planejado, como ela nunca havia imaginado. Confessou a incapacidade de se manter longe, o medo da vulnerabilidade, a atração que ela exercia, confessou sua incapacidade de resistir.
Ela estava perplexa, imaginando o tamanho de seus medos e o quanto tudo devia ser verdadeiro. Ela não sabia como dizer que passou todo o tempo esperando por essa sinalização, que também não compreendia o que sentia, que tinha tanto medo quanto ele. Os mundos diferentes pesariam em algum momento...
Ele calou, sem aviso. Se trancou novamente, e tudo o que restou foi o olhar. Com medo de ser traído pelas palavras, se agarrou a ela, mas se fechou. Ela não imaginava que ele se manifestaria novamente, até que um incidente o fez sair da letargia auto-imposta. Ela caiu, ele não levou mais de cinco segundos para alcançá-la, para colocá-la no colo e mostrar para todos a sua menina. Numa manifestação pública do que havia dito horas atrás, ele a toma para si. E não a deixa mais ir.







playlist

James Morrison
Jason Mraz
Shakira
Eros Ramazzotti



*like you*

sábado, julho 11, 2009

Just a kind of magic...

"...THE ANGELS GET A BETTER VIEW OF THE CRUMBLING DIFFERENCE BETWEEN WRONG AND RIGHT..."
Counting Crows, Round Here.










"I walk in the air between the rain
through myself and back again
where?
I don't know..."




Era um fim de sexta, preguiçoso e despretencioso. Combinaram na Central do Brasil. Seria divertido, ela sabia. Gostava das piadas, do jeito direto e sem meias palavras, da vontade de abraçar o mundo, do romantismo revolucionário que sobreviveu ao segundo grau. Gostava da companhia e precisava rir, foi o determinante. Correria, e ela ia atrasada. O relógio, inclemente, ia roubando o tempo, se apoderando de seu recesso. Insistiu, afinal, era sexta!
Rio de Janeiro transbordando de gente, ainda cedo, hora do rush. Quem sai do trabalho não vai pra casa, quem sai de casa, vai pro bar. Sinuca no Baixo Méier: mesas cheias, volume alto. Fugiram. Do outro lado da rua um ambiente mais promissor, mesinhas na calçada, grades que separam mundos. Os tios, os mais velhos e/ou abastados, dentro do cercadinho em que se tranformava o passeio em dia de casa cheia e os adolescentes, os alternativos, os descapitalizados do lado de fora, curtindo a noite do mesmo jeito, se divertindo tanto quanto.
Passaram da idade de beber com os meninos. Sentados em cadeiras entalhadas em madeira, mesinhas decoradas e convidativas, garçons atenciosos e solícitos, bebida gelada e sossego, viajaram: Psicologia da Educação, velhos conhecidos, Vigiar e Punir, Turismo, novas tecnologias, demonização da cartilha de alfabetização, não-demonização do Zé Dirceu, o PT, o PDT, a ANEL e a tiragem de delegados nos botecos (como entendem disso!). Algumas cervejas depois, uma aparição. Um rostinho branco flutuava entre as grades que dividiam crianças e adultos. Uma fadinha branca e sorridente, de rabo de cavalo e roupa preta, camuflada na escuridão. Um olhar vivo, queixo altivo, discurso fácil. Bem humorada, bem articulada, com uma long neck na mão deixa a mulher completamente encantada. A fadinha se pendura na grade, diz que a conhece e sorri pro rapaz. Eles trocam olhares cúmplices e palavras carinhosas. Sentada ao lado dele, ela procura lembrar daquele projeto de elfo e se vê num espelho, visitada por seu eu de quinze anos atrás. Lembranças boas afloram e ele percebe. A garotinha vai embora, deixando-o com a missão de explicar quem ela é.
Ele não se furta, diz o que é a fada que acabou de deixá-la encantada... Enquanto esperam juntos por sua revolução de Academia, com vinho caro e cargos de Ministério, com seu marxismo de boutique e o ar blasé de quem acha que já contribuiu para mudar o mundo, aquele ser que parece mágico mora num abrigo público, tem 17 anos, foi abandonada pela mãe e ainda acredita que o mundo vai mudar. E ainda briga, com a fé que é só das crianças, para que o mundo seja justo, no final. Com a fé que eles já tiveram. Com a fé que essas criaturas de outras realidades inspiram.



playlist

Counting Crows
U2 (era pré messiânica)
Pearl Jam
Sound Garden
Keane
ColdPlay







*mudando*

quinta-feira, julho 09, 2009

"...AND IN THIS CRAZY LIFE AND THROUGH THESE CRAZY TIMES..."
Michael Buble, Everything.








"...you're a mistery
you're from outer space
you're every minute of my everyday..."




A caminhada no parque tinha sido divertida e ela queria estender aquele início de noite pra sempre. Falavam de projetos, empresas, convergência de ações. Falavam de planos e dividendos comuns, sobre como transformar o que tinham de par em ímpar...
Um vento frio começou a soprar sem ser percebido, eles sentaram num banco a observar os passantes. Ela o deixava desconcertado em alguns momentos, ele a deixava sem fala. Tocavam-se nas mãos e o tempo parecia não passar. Não passava. Até o dia seguinte seria seu momento, sem importar o que acontecesse no resto do mundo. Tinham pouco tempo, sempre.
Deram-se conta da chuva quando seus corpos começaram a sentir o frio das gotas grossas, e constantes. Em pouco tempo desabava dos céus uma tempestade, e ela ria, feliz! Correram por toda extensão da grade do parque até o estacionamento, e chegaram ao carro encharcados. Detiveram-se num longo beijo, sob as bençãos do firmamento. Um beijo que começou doce, terno e passou a exigente, molhado, de todas as formas possíveis. Um banho de chuva...


playlist

Madonna
Lenine
Zeca Baleiro
Maroon 5
The Cult
Pet Shop Boys
Duran Duran



*inspiradores*

sexta-feira, julho 03, 2009

"...E TODA NOITE SERÁ ETERNA COMO UM SONHO..."
Nenhum de Nós em Canção Em Volta Do Fogo



"...durma que a lua eu vigio
se o céu te parece ruir
em pedaços de vidro
dançaremos em volta do fogo
subiremos com a maré
e amanheceremos denovo..."




Em algum momento as luzes pararam de piscar, e tudo ficou sério...
- Nós nunca imaginaríamos isso. - *era mesmo uma frase definitiva*
- Claro que não. Você sempre foi tão... fofo! - *ela vacilou diante do que podia ser dito*
- Fofo é o adjetivo mais másculo em que você pôde pensar, claro... - *ele se divertiu*
- Não é isso... - *corando*
- Claro que é! E foi uma surpresa grande pra mim, também... - *todo sinceridade* - Somos boas surpresas, moça!
- Ah, entendo o que quer dizer! - *sem muita convicção*
- Será que entende mesmo? Estive na sua casa antiga há uns três meses atrás... - *um sorriso de canto de boca*
*ela sorriu, agora genuinamente surpresa, não pôde evitar arquear as sobrancelhas*
- O que foi? - *como se não soubesse*
- A vida é engraçada... - *constatação simples*
- Ah, eu estava passando perto... - *justificando???*
- Da casa? Eu não estava pensando nisso... Estava pensando em como não importa o atalho que a gente tente pegar... - *evitando o olhar dele*
- Também não importa o quanto a gente tente dar voltas, e adiar. Chega o dia em que você vai ser confrontado com o que vem protelando. Mais cedo, ou mais tarde. Pra sorte de alguns, mais cedo... - *procurando o olhar dela, e sorrindo ao encontrar*
E, por um instante, a procura fez sentido...



playlist

Since I Don't Have You - Guns
November Rain - Guns
Você Vai Lembrar De Mim - Nenhum de Nós
Eu Caminhava - Nenhum de Nós
Sobre O Tempo - Nenhum de Nós
You Are Not Alone - Michael Jackson




*momentos*

sábado, junho 27, 2009

"...YOU ROCKED MY WORLD, YOU KNOW YOU DID..."
Michael Jackson em You Rock My World




"...in time I knew that love would bring

this happiness to me

I tried to keep my sanity

I waited patiently..."

Recebeu o recado dele antes do almoço, mas não havia tempo pra pensar. Vestiu black jeans, uma regata e um par de botas para enfrentar a chuva do lado de fora. Gloss nos lábios e uma máscara para os cílios: precisava ser prático, precisava ser rápido! Pegou um trench coat para vencer o frio e a mochila com seu kit de emergências acadêmicas. Correu para o ponto de ônibus sem olhar para o relógio, já estava atrasada.
Terminara a prova e eram doze andares até o térreo do bloco. Saiu da faculdade disposta a percorrer a pé os dois quilômetros que a separavam do ginásio, uma distância longa demais, antes de conhecê-lo. Entrou pelo estacionamento, já que ele não atendeu ao telefone, e foi certificar-se de que o carro parado na vaga marcada era o que procurava - era tão desligada que sequer lembrava a cor do carro dele, era verde ou azul, dependia do tempo no dia, quanto à placa, nem ousava querer lembrar...
Ela parou à porta do ginásio, ele não percebeu sua presença. Testosterona por toda parte, eles se estranhavam na quadra. Hipnotizada pelos músculos tensos dele, dentro do uniforme, ela mal se deu conta da pausa no jogo. Perdida em pensamentos distantes, foi acordada pelo toque das mãos dele, em sua cintura, pela corrente elétrica que a percorria, quando ele se aproximava. Ele a virou de frente e deu-lhe um beijo terno na testa, tratando de mantê-la longe de seu corpo suado. Ela o abraçou despreocupadamente, colando o rosto ao seu peito e sentindo as batidas aceleradas de seu coração.
Não havia passado uma hora, quando ele sugere que vão embora e ela aceita, sorridente, indo arrumar suas coisas no carro. Não demora e ele aparece, cabelos molhados, mochila na mão, bata branca e uma sandália que ela adora, uma calça clara e um sorriso de iluminar o mundo. Ele abre a porta para ela, e toma o assento do motorista. Seguem em direção ao seu restaurante preferido, música suave e ela tentando convencê-lo a participar do almoço de aniversário de um dos seus patrocinadores. Antes de chegarem ao destino ele já está convencido e promete ir, pois quer agradá-la com o gesto de boa vontade.
Ele a surpreende pedindo dois drinks antes do jantar - ele nunca consome álcool - e escolhem o que vão comer. Ele parece ansioso, pede mais dois coquetéis, depois do prato principal, e levanta da mesa alegando precisar do telefone que ficou no carro. Numa curiosa coincidência, enquanto ele sai, o rapaz no piano passa a tocar a música dos dois e ela vai terminando o coquetel. Ele volta: flores vermelhas e uma caixinha com um anel de brilhantes. Ele a observa, ela se reconhece naqueles olhos encantadores e os dois saem apressados, a sobremesa os aguardava em alguma parte do apartamento dele...



playlist MJ

You Rock My World
Liberian Girl
The Girl Is Mine
I Just Can't Stop Loving You
The Way You Make Me Feel
Remember The Time



*a wow day*

sábado, junho 20, 2009

"...SHE SAID SHE'D LIKE TO MEET A BOY WHO LOOKS LIKE ELVIS..."
Counting Crows em Round Here





"...she walks along the edge
of where the ocean meets the land
just like she's walking on a wire
in the circus..."





Minutos após a aeronave tocar o solo ela tentava se conectar novamente a seu mundo, não tinha o costume de se angustiar com pousos e decolagens, como era comum a tanta gente. Sua angústia era adentrar o salão de desembarque e olhar para fora do vidro, encontrar algumas dezenas de olhares esperançosos e perceber que, novamente, tomaria um táxi até o portão de casa.
Não costumava carregar muito mais do que uma mala e alguma bagagem de mão, reflexo da vontade sempre latente de voltar - não queria deixar a cidade com a sensação de que poderia ficar tempo demais fora. Mais uma vez recorreu ao rapaz que organizava a fila do transporte, queria sair logo, o clima de boas vindas do aeroporto a deprimia. Além de tudo, estava cansada: antevia a longa viagem com os congestionamentos de sua Cidade Maravilhosa.
Entrou no automóvel de forma mecânica e sem muito entusiasmo com o condutor que tentava ser simpático perguntando pela viagem. Lembrou que viajantes solitários sempre lhe despertaram, também, uma certa compaixão e não foi de todo seca, mas na primeira oportunidade abriu um livro para ter no que se concentrar. Odiava o pobre do Focault, mais pela obrigatoriedade da leitura do que pela chatice de alguma de suas obras, mas era tudo o que podia ser feito pra manter o moço simpático calado, e seria um longo caminho.
Ela deu algumas instruções ao motorista quando chegaram ao bairro destino e agradeceu o fim da jornada. O porteiro, solícito, levou as malas à porta do apartamento, falando da satisfação de vê-la de volta, tagarelou até que tivessem vencido os tantos andares que a permitiriam ficar só com suas lembranças. Abriu a porta e se espantou com a profusão de flores em um arranjo quase maior que ela, no meio da sala de estar - sorriu aliviada: não podia ser coisa da empresa. Procurou uma pista qualquer sobre o remetente, prevendo o óbvio, e se encantou com o cartão. O 'Eu Te Amo' ainda tímido, escondido entre um monte de palavras, nada típico de quem já passara dos mil e quinhentos dias, mas marca indelével do que ela queria encontrar, embora parecesse já ter perdido as esperanças. O celular tocando dentro da bolsa era a prova de que ele controlava o tempo, sempre sabia o momento exato, de alguma forma. Suspirou e atendeu: voltar pra casa é colocar os dois pés no chão, das mais diversas maneiras.



playlist

Ana Carolina
Fernanda Porto
Isabela Taviani
Nando Reis
Adriana Calcanhoto






*de acreditar*

terça-feira, junho 16, 2009

"...JÁ NÃO TENHO ESCOLHA: PARTICIPO DO SEU JOGO..."
Capital Inicial em Fogo




"...não consigo dizer se é bom ou mal
assim como o ar me parece vital
onde quer que eu vá, o que quer que eu faça
sem você não tem graça..."


Foi convencida pelos argumentos irrefutáveis dele. A viagem em busca de um inverno autêntico, com temperaturas negativas e flocos brancos na janela, pareceu atraente. Deixar pra trás a indecisão da estação nos trópicos, também: tinha cansado de escolher correndo a roupa para usar em dias que começavam quentes e, não raro, terminavam com um dígito nos termômetros. Decidiu esquecer da chuvinha chata para viver as tempestades, a neve, o gelo que se pode sentir nos ossos, por alguns dias, ao menos.
Pensaram logo num chalé em uma cidade pequena, com pouca gente em volta e muito tempo pra aprender com os silêncios do outro. Na bagagem alguns livros, vinhos, problemas de som e imagem resolvidos e telefones que não seriam utilizados. Um bosque em volta da casa e o sol tímido que viria só para começar a derreter o gelo da noite.
Chegaram em meio à bruma, final de madrugada, excitados com a perspectiva do descanso e do conhecimento mútuo. Ele se livrou das malas tiradas do carro e acendeu a lareira, ela espalhou incenso pelo chalé e serviu duas taças grandes de vinho. Ficaram largados juntos, no sofá, enquanto o rádio misturava música suave com notícias sobre o tempo. Não tardava o alvorecer quando descobriram os corpos em ritmo par e as boas vindas dadas pelas nuvens que se abriam descortinando uma claridade suave que, refletida na neve, entrava aos poucos pelas janelas cerradas e se derrameva pela sala de estar. Ela abriu os olhos quando ele virou-se de bruços, enlaçando-a com um braço por cima de seu torso. Alguns pássaros cantavam uma melodia distante e, quase em transe, ela agradeceu ter cedido tão facilmente.





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Snow Patrol
The Killers
Travis
Keane
Better Than Ezra
Blur





*viagens*

terça-feira, junho 09, 2009

"...QUANDO EU ESTIVER FOGO, SUAVEMENTE SE ENCAIXE..."
Skank em Sutilmente







"...e quando eu estiver triste
simplesmente me abrace
e quando eu estiver louco
subitamente se afaste
e quando eu estiver bobo
sutilmente disfarce..."




São tão afins que transformam qualquer tema em texto leve. Sentadas, entre uma taça de vinho e outra, falavam de feridas, das de cicatrização rápida e quase imperceptíveis e daquelas que deixam marcas do tamanho do mundo, visíveis ou não. Uma compenetrada e sensível, a outra debochada e mordaz, uma transparente, a outra expansiva. Duas mulheres fortes, sem dúvida, mas uma esconde si a força que tem, a outra mostra o que o mundo quer que ela seja. Complementos, variações do mesmo tema, não sei...
Trocam impressões enquanto a noite avança, finalizam a garrafa e pedem o jantar. Riem dos pequenos medos conjuntos - um tipo de senso comum do amor romântico - , se agitam ao lembrar embates passados e dores póstumas. Tão diferentes, uma delas exibe orgulhosamente suas cicatrizes de batalha, experiências que lhe mostraram o que não fazer, fala até do medo de avião - resultado de voltar pra casa e sempre encontrar o aeroporto vazio. A outra se fecha, não se expõe, absorve a narrativa da ruivinha que se mostra do outro lado da mesa, mas não se encoraja: lembrar dói...
Sentidos apurados, outra garrafa, ânimos descontraídos, o restaurante começa a ficar cheio. Mudam de assunto. Com sorrisos cúmplices sinalizam, uma pra outra, que são observadas. Tomam o cuidado de não cruzar olhares com os rapazes na outra mesa e não encorajar uma aproximação desastrosa. A conversa segue seu rumo até que uma presença forte pode ser sentida: ele se aproxima e sorri, cumprimenta a amiga e observa a namorada. Antes de beijá-la reprova a garrafa quase vazia em cima da mesa, sem desconfiar ser a segunda. Fala sobre o dia e os três se divertem com os causos que ele conta. As moças absorvem suas palavras, mas sua menina parece longe, a lhe admirar. A outra entende que a conversa do início da noite está surtindo efeito - vê nos olhos da amiga - e se satisfaz, já que ela não se deixa abater.
Dois cafés, três garrafas de água, sorrisos e despedidas. O rapaz bonito continua intrigado com a expressão da sua menina - ela não mudou em um milímetro o olhar de adoração - e a amiga leu fácil o 'eu te amo' que ela, sem palavras, dizia a ele. Resolveu deixá-los a sós, agradecendo pela capacidade que temos para entender as adversidades. No saldo da noite fica a compreensão, maior que nunca, do significado das cicatrizes e a prova da existência do amor incondicional, já que esse mesmo rapaz bonito e tão amado é a razão daquele medo de avião manifestado pela ruivinha, lá no início.



playlist

The Corrs
Pretenders
Alicia Keys
Joss Stone
Norah Jones
Marienne Faithfull


*.*

quarta-feira, junho 03, 2009

"... WELL MAYBE I'M IN LOVE..."
Counting Crows em Accidentally In Love










"... how much longer will it take to cure this
just to cure it cause I can't ignore it if it's love
makes me wanna turn around and face me but I don't know nothing 'bout love..."





O clima de uma cidade que não é a sua domina o ambiente. O caminhar pela rua molhada, depois da chuvinha fina e insistente, é pontuado por seu olhar de admiração: a cidade fica realmente bonita, nesse outono-quase-inverno. As pessoas estão desconfortáveis - cariocas, geralmente, perdem a identidade sem o sol e o calor inclemente do verão dos trópicos. Ela gosta da sensação de ter a pontinha do nariz gelando, de ver as ruas quase desertas e ainda não são nove da noite. 
Seus passos são firmes e não demora cruzar os portões de casa. Odores familiares e o ar morno no interior do apartamento fechado dão as boas vindas, aconchego e uma pequena pontada de solidão. Ela joga a mochila com o notebook sobre o sofá, vai até a cozinha e descarrega o conteúdo das sacolas que trouxe nas mãos: uma garrafa de vinho tinto, queijos, frutas vermelhas, pão italiano e creme de leite fresco. Livra-se das botas e se serve de uma taça da garrafa que acabou de chegar. Os últimos vestígios do quase-inverno deixam seu corpo, ao sabor do pinot-noir. Tempera a cena com Counting Crows no CD player e pimenta branca e queijo ralado no sanduíche.
Ao passo que prepara o banho quente, afoga-se em lembranças: o restaurante da moda e o blockbuster do dia anterior, a Shadow que lhe rouba o ar, o cinema quase vazio, o estacionamento do shopping deserto, a sensação de ter seu gêmeo perdido ao alcance da mão. Deixa-se envolver pela água, pela toalha, pelo cabelo molhado a grudar no  rosto, o refrão da música colando às lembranças recentes, enfia-se num robe enxuto e completa a taça de vinho. Os pés no chão gelado, a refeição esperando na bancada, a voz conhecida do outro lado da linha, no celular que não parava de chamar: ele precisa saber se está tudo bem. Ela sorri, fala do seu dia e faz alguma pergunta, só pra constar. Já não parece tão só. A voz faz com que seu peito seja invadido pelo calor que faltava. Está completa. A fome aumenta, "boa noite, meu amor!", sorve o vinho e as palavras, se dedica ao jantar. Outra taça, esta colorida e coberta de creme e açúcar, atiça suas vontades e não oferece resistência. A palavra de ordem é prazer. 
Joga a mochila em outro canto da sala, e uma manta sobre o sofá. Desliga as luzes, diminui o volume do som, enrola-se, encolhida, no tecido e descansa a cabeça numa almofada qualquer. Com o pensamento pairando do outro lado da cidade, adormece, enfim...




playlist

Counting Crows
The Killers
Panic! At The Disco
The Strokes




*accidentally*